Europa e Mundo – UE precisa do Brasil para uma nova estratégia global

O fortalecimento das relações da União Européia com a América Latina é estratégico para a Europa, e o fortalecimento dos laços UE-Brasil pode ser a chave, escreve Antoni Comín i Oliveres.

Antoni Comín i Oliveres é membro não inscrito do Parlamento Europeu.

Os governos da UE estão preocupados com a abordagem do presidente Lula à narrativa da China sobre a guerra na Ucrânia e suas importantes nuances sobre a posição da UE sobre essa violação do direito internacional com efeitos globais.

No entanto, talvez não percebamos que a aproximação entre China e Brasil, que afeta questões prementes como a guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, também tem a ver com a intensificação das relações comerciais.

Durante sua última viagem de Estado à China, em abril, Lula assinou mais de 20 acordos bilaterais para fortalecer a cooperação comercial, de investimentos e de desenvolvimento de infraestrutura entre o Brasil e o gigante asiático.

Há algum tempo, a China vem ganhando rapidamente posições como o principal parceiro comercial da América Latina e, em particular, do Brasil. A China é o principal parceiro comercial do Brasil desde 2009, e o comércio entre os dois países se multiplicou por vinte em vinte anos: de US$ 7,2 bilhões em 2003 para US$ 150,4 bilhões em 2022.

Durante todos esses anos, e muito antes, as negociações do Acordo Comercial do Mercosul não avançavam e ainda hoje estão pendentes.

Durante a visita, a China ofereceu ao Brasil um ambicioso pacote de investimentos, inclusive em setores inovadores como o de veículos elétricos, para aumentar a base industrial do país, uma das principais metas de Lula para superar uma estrutura econômica excessivamente baseada na exportação de commodities.

O Conselho Empresarial Brasil-China informa que o Brasil é atualmente o principal receptor de investimento estrangeiro direto da China.

Perante esta situação, a paralisação europeia é preocupante.

A UE e o Mercosul chegaram a um acordo político para um FTA UE-Mercosul em 2019, mas a ratificação por todos os Estados-Membros da UE ainda está pendente. Enquanto Bolsonaro estava no poder, era compreensível que a ratificação do Tratado fosse suspensa, dada sua política agressiva no campo ambiental.

No entanto, o retorno de Lula implica um novo compromisso do Brasil com os desafios ambientais e climáticos globais, o que remove qualquer desculpa para não ratificar o acordo UE-Mercosul com urgência.

Para a Europa, fortalecer as relações com a América Latina é estratégico.

Em primeiro lugar, uma aproximação entre os dois continentes é fundamental para que a política internacional evolua na direção que a UE preconiza.

Hoje em dia, a Europa sonha com um sistema internacional presidido pelo respeito pelos princípios da Carta das Nações Unidas e pelo direito internacional, mas sabemos muito bem que a ONU não tem autoridade para impor nada disso sozinha.

Por isso, o sucesso de tal paradigma depende inevitavelmente da aliança entre as regiões do planeta que privilegiam o multilateralismo organizado em torno da ONU, a democracia liberal e os direitos humanos, e uma economia aberta enquadrada em um sistema de comércio mundial que respeite os direitos sociais e o ambiente.

A América Latina e a Europa compartilham esses objetivos. É por isso que sua aliança é estratégica em escala global.

A UE também está interessada em aprofundar seus laços comerciais e políticos com países como o Brasil. Está relacionado com o que poderíamos chamar de “look francês”.

A autonomia europeia em relação aos EUA é e tem sido uma obsessão francesa. Desde o fim da Segunda Guerra Mundial, a França teme que as relações transatlânticas se transformem em relações de subordinação da Europa aos EUA.

No entanto, a Europa precisa preservar essas relações transatlânticas se não quiser enfraquecer sua posição geopolítica.

A melhor maneira de fazer isso sem arrastar o Velho Continente para uma dependência excessiva dos EUA é repensar essas relações dentro de um paradigma triangular.

Um triângulo transatlântico EUA-América Latina-UE permitirá que a Europa e a América Latina mantenham e fortaleçam os laços com os EUA sem serem excessivamente condicionadas por sua liderança e interesses.

O eixo bilateral UE-América Latina pode ajudar a compensar, quando necessário, a influência decisiva dos EUA neste triângulo transatlântico.

Assim, é difícil compreender que o país europeu que mais faz para preservar e aprofundar a autonomia estratégica da UE face aos EUA, a França, seja o primeiro a – em nome da defesa dos interesses dos seus agricultores – colocar obstáculos no caminho da ratificação do acordo comercial com o Mercosul pela UE.

Esta é uma forte contradição. Se queremos que o Brasil não aborde conflitos como o da Ucrânia com a narrativa chinesa, e se, ao mesmo tempo, queremos que a UE tenha relações transatlânticas equilibradas que evitem a dependência excessiva dos EUA, intensificando os laços comerciais e políticos com o principal país da América Latina é fundamental.

Agora que nosso interlocutor é Lula, não devemos desperdiçar a oportunidade de avançar nessa direção.

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