Quatro regiões ocupadas na Ucrânia iniciaram a votação do referendo para decidir se querem fazer parte da Federação Rússia e seguir sua Constituição ou não, preparando o terreno para Moscou anexar as áreas em uma forte escalada da guerra de quase sete meses.
A Ucrânia e seus aliados ocidentais rejeitaram os votos como ilegítimos e nem livres nem justos, dizendo que não terão força obrigatória.
O chanceler alemão Olaf Scholz e o presidente dos EUA, Joe Biden, classificaram os votos como “referendos falsos” esta semana, enquanto o presidente francês Emmanuel Macron disse que não teriam “consequências legais”, e o presidente ucraniano Volodymyr Zelenskyy os chamou de “barulho” para distrair o público.
Durante o verão, quando o Kremlin esperava uma rápida captura de toda a região de Donbas, as autoridades locais falaram sobre a organização das votações em setembro.
Tropas russas e forças separatistas locais assumiram o controle de praticamente toda a região de Luhansk, mas apenas cerca de 60% da região de Donetsk. O ritmo lento da ofensiva da Rússia no leste e a pressão ucraniana para recuperar áreas na região de Kherson fizeram as autoridades em Moscou falarem em adiar as votações até novembro.
Os planos do Kremlin mudaram novamente depois que uma contra-ofensiva ucraniana relâmpago este mês forçou as tropas russas a recuar de amplas faixas da região nordeste de Kharkiv e aumentou a perspectiva de mais ganhos pelas forças de Kiev.
Analistas já consideram que ao se mover rapidamente para absorver os territórios capturados na Rússia, o Kremlin espera forçar a Ucrânia a interromper sua contra-ofensiva e aceitar as atuais áreas de ocupação ou enfrentar uma retaliação devastadora.
O processo de votação de cinco dias ocorrerá na ausência de monitores independentes e oferece amplo espaço para manipulação do resultado.
Se os referendos organizados às pressas parecem familiares, é porque é uma tática que a Rússia já usou antes.
Em 2014, realizou um referendo convocado às pressas na região da Crimeia, na Ucrânia, que também foi denunciado pelo Ocidente como ilegal e ilegítimo. Moscou usou a votação como justificativa para anexar a península do Mar Negro em um movimento que não foi reconhecido pela maior parte do mundo.
A votação de 2014 na Crimeia foi realizada sob a vigilância apertada das tropas russas logo após terem ultrapassado a península, onde a maioria dos moradores era pró-Moscou.
Separatistas que controlam grandes partes do Donbas desde 2014 há muito pressionam para se juntar à Rússia e mostram pouca tolerância à dissidência. Quando a rebelião eclodiu lá, os separatistas rapidamente organizaram referendos nos quais a maioria votou pela adesão à Rússia, mas o Kremlin ignorou o resultado.
As duas regiões declararam sua independência da Ucrânia semanas após a anexação da Crimeia, desencadeando oito anos de combates que o presidente Vladimir Putin usou como pretexto para lançar uma invasão em fevereiro para proteger seus moradores.
Menos gastos e perdas militares da Rússia, mais riscos de guerra em toda a Ucrânia
A Rússia encontrou outro espaço para iniciar o referendo, observou que as perdas estavam desproporcionais com seus planos e está disposta a refazer o processo de 2014 na Crimeia.
Caso o referendo se confirme, tudo indica que será confirmado nos próximos cinco dias, a Rússia obterá o controle de toda a região de Donbass, incluindo a área ainda não controlada, forçando a Ucrânia a afastar suas tropas da linha de frente e proteger o flanco oeste do País.
Se, por ventura, as forças ucranianas emitirem ataques coordenados contra os territórios anexados, poderão desencadear uma guerra sangrante por toda a Ucrânia e empurrar o governo de Zelenskyy para o controle do alto escalão russo.
A única maneira de atacar Donbass protegido pelos russos seria ataques de guerrilhas e sem bandeira, como a Ucrânia fez na Crimeia semanas atrás, não reivindicando o ataque que resultou em perdas consideráveis nas Forças Russos, já que se confirmasse seria uma agressão direta contra a Rússia.
Em caso de decisão positiva nos referendos sobre a entrada das repúblicas de Donbass, Kherson e a parte libertada das regiões de Zaporizhzhia na Federação Russa, serão necessários vários procedimentos, incluindo a assinatura de documentos pelo parlamento e pelo Presidente Putin.
Nesta sexta-feira, 23 de setembro, o representante oficial do Kremlin, Dmitry Peskov, disse que o processo de união das repúblicas de Donbass e outros territórios liberados na Federação Russa seria realizado rapidamente.
Segundo Peskov: “não posso dizer com certeza. Na verdade, estou convencido de que será rápido o suficiente”.