Por que é tão importante um porta-aviões para a Turquia?

Nos últimos 40 anos, a Grécia e a Turquia se viram à beira da guerra por causa da soberania sobre as águas do Mar Egeu. Fatores históricos pesam muito: a Turquia perdeu a maior parte de seus territórios europeus nos séculos XIX e XX, enquanto a Grécia manteve a hegemonia cultural sobre a área, bem como o litoral da Anatólia, desde os tempos antigos: Constantinopla caiu nas mãos dos otomanos cinco séculos antes (1453), mas as populações gregas permaneceram até recentemente na margem oriental do Mar Egeu.

Segundo Didier Ortolland em seu majestoso estudo sobre as disputas entre Turquia e Grécia pela região e publicado na revista La Revue Géopolitique, o Tratado de Lausanne datado de 24 de julho de 1923 levou à fuga de 1,3 milhão de gregos das regiões de Esmirna e da Trácia Oriental, e de 400.000 muçulmanos que deixaram a Trácia Ocidental para se estabelecer na Turquia. Existem assim duas realidades históricas opostas, juntamente com o ressentimento.

A Grécia logicamente possuía quase todas as ilhas do Mar Egeu, povoadas por gregos desde os tempos antigos. No entanto, a evolução do direito internacional, após a Segunda Guerra Mundial, e particularmente após 1958, tem dificultado o status quo.

Com efeito, as ilhas gregas estão espalhadas por todo o Mar Egeu, chegando à costa da Turquia; particularmente no caso de Lesbos, Chios, Kos, Rodes e Samos. Algumas ilhas menores estão ainda mais próximas, como Megisti (kastellorizo) localizada no sudeste a apenas 1.300 m da costa turca. Esta situação se complicou muito com a evolução do Direito do Mar.

Para restabelecer seu domínio e direito do mar mais expansivo e livre para exercícios navais e transações comerciais, a Turquia necessariamente precisa elevar seu Poder Naval.

Em julho de 2017, ao supervisionar o lançamento de uma corveta de fabricação nacional, o presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, expressou o objetivo de seu país de construir porta-aviões próprios como parte dos esforços de Ancara para se tornar independente no campo da defesa até 2023.

Os turcos se destacam como grandes construtores de submarinos para sua Esquadra, está em andamento a classe Reis sob contrato de desenvolvimento para 6 submarinos do tipo na casa de US$ 2 bilhões de dólares cada, um salto na independência naval bélica.

No atual cenário naval, a Turquia possui como carro-chefe no quesito capacidade aeronaval a classe recém lançada de navio de assalto anfíbio TCG Anadolu, um bela embarcação qualificada como porta-aviões leve baseada no navio anfíbio espanhol Juan Carlos I.

A princípio, os reais planos dos almirantados turcos eram consolidar a classe Anadolu como a principal operadora dos F-35 Lightining II da Lockheed Martin, ofuscado pelo boicote geral do Departamento de Defesa Americano após as graves transações de sistemas de defesa antiaéreas da Rússia serem adquiridas por Erdogan, para o ocidente foi uma traição, já que a Turquia faz parte da OTAN, mas para os turcos somente sobrevivência e interesse próprio.

Deste modo, ter à disposição um porta-aviões como o Anadolu ou superior é o divisor de águas no atual cenário do Mar Egeu e por todo o Mediterrâneo.

Alternativamente ao desmonte do caça furtivo F-35, o Anadolu poderia servir puramente como um porta-helicópteros transportando os AgustaWestland T129, que a Turquia co-produziu com a Itália, junto com helicópteros de carga pesada, semelhantes aos Chinooks.

De fato, os gastos foram vultosos, e a expectativa da função principal da plataforma Anadolu seja como porta-aviões leve, e seu comissionamento muito provavelmente se concretize em maio deste ano, e assim como espanhol Juan Carlos I atua como navio de transporte de tropas, opera também com caças Harrier AV-8B, e há relatos de analistas aeronavais do país a chance da Marinha turca adquirir os caças russos Sukhoi Su-33 Flanker, uma aeronave de superioridade aérea de um único assento que opera em porta-aviões multifuncional convencional.

Além disso, à favor de incrementar o poder naval turco, surgiu a hipótese da Marinha turca recuperar a NAe São Paulo recentemente comprada do Brasil como plataforma de treinamento aeronaval, são cogitações importantes.

A Marinha e o Exército turco possuem grande experiência de atuação de frente e intervenções cirúrgicas em nações. Há 4 anos havia inúmeros militares estacionados no Golfo Pérsico, e Erdogan construiu uma base na Somália para ajudar a treinar o exército nacional a fim de combater o grupo Shabaab, além de atuarem na porção norte da Síria e no Iraque contra terroristas, e também contra curdos que os considera como tais.

Nas entrelinhas, Turquia não está para brincadeira, sabe muito bem se posicionar e dissuadir seus adversários, um alerta à Grécia. Pela região, Turquia e Egito se destacam como as únicas nações a possuir navios de ataque anfíbio, porta-aviões leve, os egípcios possuem a classe francesa Mistral, adquirindo as embarcações da França em 2015, dando a eles uma capacidade de carga pesada que poucos países no mundo podem se orgulhar.

O cenário bélico atual tomou formas escandalosas de proporção, nações que até então sonhavam em possuir a tecnologia naval de porta-aviões ou submarinos, hoje, desenvolvem seus próprios dispositivos regularmente e a passos rápidos, e quem possui tais capacidades são recrutados no clube de dominadores marítimos e aéreos que a Turquia, apesar de recém-ingressada, goza de experiência e força, mas que precisa reequipar seus quadros aeronavais o mais breve possível, caso queira dissuadir todo o Mar Egeu.

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Felipe Moretti
Felipe Moretti
Jornalista com foco em geopolítica e defesa sob registro 0093799/SP na Secretaria de Trabalho do Ministério da Economia. Especialista em análises via media-streaming há mais de 6 anos, no qual é fundador e administrador do canal e site analítico Área Militar. Possui capacidade técnica para a colaboração e análises em assuntos que envolvam os meios de preservação e manutenção da vida humana, em cenários de paz ou conflito.
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